6 de julho de 2015

Resposta ao texto "Polêmica", de Valter Pomar


Por Marcelo Barbosa

Após a última réplica do meu diálogo com o companheiro Valter Pomar sobre o texto Mito e realidade no cotidiano petista recebi, quase simultaneamente, duas mensagens: a primeira, do próprio Valter (reproduzida abaixo), espinafrando meu novo texto. A segunda, de felicitações ao conteúdo da minha resposta, assinada por esse grande brasileiro, o senador Saturnino Braga. Ao primeiro respondo abaixo, ao segundo agradeço o apoio.

Vamos, então, na ordem proposta pelo Valter:

1- Em 2014, a ajuste ideado pelo ministro Mantega era pensado como conjunto de medidas para reequilibrar as contas públicas. Não tinha a abrangência que assumiu em 2015. Foi o quadro surgido nos meses de janeiro a março que lhe deu a atual configuração, inclusive no que diz respeito à violência dos cortes orçamentários aprovados.

2- Concordo quando você diz que o ajuste provocará mais instabilidade. Porém, ao momento, a instabilidade teve e tem natureza política. A tarefa das forças democrático-populares é a de disputar o governo para a realização de uma outra orientação econômica, antes que os efeitos da atual, que ainda não se fazem sentir com tanta intensidade, se generalizem.

3- Não considero o Cunha e o Temer parceiros na construção de um projeto de nação. No entanto, há que se fazer distinções entre um e outro. Enquanto Cunha trama a derrocada do nosso governo, Temer defende a legitimidade do mandato da Presidenta Dilma.

4- Não vejo vínculo direto, como você diz, entre a nossa política de alianças e atual política econômica. O PMDB se singulariza por ser uma agremiação fisiológica e não um partido dotado de uma ideologia clara. Para nossa surpresa, quem propôs um ajuste de corte “tucano” foi o PT e, não o PMDB. O problema apresenta uma complexidade maior do que você deseja admitir.

5- Gostei de saber que você irá pensar sobre a minha argumentação acerca da atualidade da questão nacional.

Recomendo a você a leitura (ou a releitura) de textos que constroem pontes de diálogo entre as diferentes vertentes do pensamento social brasileiro, mesmo quando conduzindo a conclusões diferentes das minhas, a exemplo de “Subdesenvolvimento: fênix ou extinção”, de Chico de Oliveira, a respeito da obra de Celso Furtado.

6- Com relação à Constituinte Exclusiva, uma dúvida me vem à mente: com qual Walter Pomar devo manter diálogo? Aquele que defende a tese do fim do ciclo da Carta de 1988, ou aquele que assina o memorável Manifesto do Grupo Brasil, documento que coloca no centro da tática do campo democrático-popular a mobilização contra o programa de contrarreformas constitucionais encabeçado por Eduardo Cunha?

7- Com relação ao projeto de nação, não alimento ceticismo igual ao seu. Ao contrário. Considero que a elaboração programática a ser proposta pela grande frente popular em gestação, vai encontrar muito mais consensos que divergência, nada obstante as diferenças de expectativas entre seus participantes. A vida dirá.


Polêmica

Por Valter Pomar

Da minha parte, faço as seguintes observações sobre a tréplica assinada pelo companheiro Marcelo Barbosa:

1- Realmente o ajuste fiscal não é “apenas um conjunto de medidas econômicas”. Mas não é exato dizer que “trata-se de solução de compromisso para diminuir a intensidade e os efeitos da crise política que quase levou ao afastamento da presidenta”. Não é exato, porque esta explicação omite o fato de que em 2014 Mantega já falava em ajuste. A escolha de Levy também foi feita em 2014. Ou seja, a decisão de fazer o ajuste foi anterior aos meses de janeiro, fevereiro e março de 2015. Logo, o ajuste não pode ser explicado nem justificado pela ofensiva da direita que é posterior à sua concepção. Ao contrário, a ofensiva da direita é que foi facilitada pelo ajuste. 

2- Exatamente por isto temos que dar um “cavalo de pau” na economia. Aliás, seria um “cavalo de pau” corretivo, pois o verdadeiro “cavalo de pau” foi dado pelo ajuste. Quem causa instabilidade é o ajuste, que aliás é um fracasso segundo seus próprios parâmetros. Ademais, o argumento segundo o qual "não há atalho para derrotar essa mal fadada política de austeridade" na prática impede uma frente em defesa de outra política econômica.

3- As coalizões no Congresso detém importância “numa via que se pretende democrática ao socialismo” a depender do programa, dos aliados e de quem dirige estas coalizões. Claro que há um vínculo direto e outro indireto entre a atual política econômica e a política de alianças. Mas o mais importante é: outra política econômica exige outra política de alianças. Ou alguém acha que a atual aliança (que inclui Cunha e Temer) é compatível com uma política de transformações profundas?

4- Vou pensar com meus botões acerca dos vínculos entre o que eu disse acerca da questão nacional, a resposta dada pelo Marcelo Barbosa a respeito do antiimperialismo, a relação disto com a Operação lava-jato e o diálogo entre as escolas do Iseb e da USP. Não estou seguro de que o “arsenal crítico da esquerda” ganhe com isto, mas certamente terei elementos para uma versão atualizada do famoso samba-enredo que falava de Xica da Silva e de Tiradentes.

5- Não basta ter lucidez tática, é preciso também ter lucidez estratégica. Por isto o tema Constituinte não deve “voltar à pauta” apenas quando a situação melhorar, sob pena de acontecer o que aconteceu em 2003. Aliás, a esquerda brasileira tem disso: quando estamos fortes, modera; quando estamos fracos, se dispersa entre os que lamentam não ter radicalizado na hora certa, os que pedem para esperar tempos melhores e os que acreditam que quem sabe faz a hora não espera acontecer.

6- Por fim: existem várias classes sociais, várias frações de classe e vários representantes políticos de cada um destes setores. Nem todo mundo concorda em “imprimir transformações profundas nas estruturas econômicas, culturais, políticas, sociais – entre outros nexos – de uma sociedade ainda extremamente desigual como a nossa”. Não se trata de expectativas, se trata de diferenças profundas. Motivo pelo qual não existe um único “projeto de Nação”. A não ser, é claro, naquele plano em que consideramos que o nosso é o único, os dos demais são falsa ideologia.

Publicado no blog do Valter Pomar.


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