19 de maio de 2016

Comentário sobre a resolução do DN-PT


Por Marcelo Barbosa


Para quem se interessar, segue abaixo um comentário, um pouco comprido, sobre a mais recente resolução do Diretório Nacional do PT que, para mim, escorrega nas considerações, mas acerta ao concluir 

Minha primeira observação tem natureza terminológica: embora alinhe corretamente as forças promotoras do golpe (ou seja, as oligarquias, a mídia monopolista e o grande capital), o texto atribui ao Congresso uma maioria “conservadora”. Talvez fosse melhor caracterizar como uma maioria reacionária. Afinal, ninguém nesse bloco parlamentar está fim de “conservar” nada. O objetivo dessa gente é fazer regredir as relações sociais ao status anterior ao pacto político-social contido na Constituição de 1988.

No mais, o documento abriga várias autocríticas, algumas justas, outras apressadas. O principal dos erros, no entanto, continua sem receber tratamento na literatura oficial do partido: a ausência de um projeto de nação, ou “democrático-popular”, ou qualquer nome que designe uma estratégia clara em favor da conquista de transformações estruturais e profundas em todos os níveis da sociedade brasileira. Desde 2010, o partido continua insistindo num “projeto”, já esgotado, de unir crescimento (mas não desenvolvimento) econômico com inserção (subalterna) de algumas reivindicações dos setores de base de pirâmide social.

Com isso, a autocrítica, também presente no documento da DN, sobre a política de alianças, acaba “girando em torno do vazio”.  Se não há um mínimo de clareza quanto às tarefas e nem quanto ao sentido da chamada revolução democrática, torna-se muito difícil definir que classes, movimentos e partidos podem se integrar numa frente política. Para saber com quem se vai é preciso primeiro saber para onde.

O diagnóstico das causas conjunturais do golpe, assinalado no texto, também não me convence. Embora tenha, desde o início, discordado da adoção das políticas de austeridade não creio que esta tenha sido a principal causa da nossa derrocada. Apesar de todo o equívoco – e mesmo da crueldade – do ajuste de Levy, nenhuma panela foi batida nas periferias do país por nossa base de apoio. De igual maneira, na hora final, não nos faltou a solidariedade dos partidos do campo de esquerda, inclusive daqueles situados no campo da oposição, conforme o caso do PSOL.

A principal causa de nossa derrota, que esperamos seja transitória, teve componente mais político que econômico. No meu entender, o nosso governo teve ilusões quanto ao caráter da conspiração chamada Operação Lava Jato. Dessa maneira, foi omisso na defesa do sistema de direitos e garantias individuais previstos na Constituição, criando condições para o alastramento da trama golpista para todas as áreas do aparelho de Estado, principalmente no Judiciário e Polícia Federal. Assim, quando se deu conta e foi para a rua chamar a população para a defesa da legalidade e da democracia, já não havia condições para montar uma resistência em condições de obter vitória.

Por fim, no que se refere às conclusões da resolução, conforme expressei inicialmente, manifesto total concordância com a análise da importância do trabalho conjunto do PT com a Frente Brasil Popular e a ênfase em unir todo campo democrático em favor do retorno ao Estado de Direito, expresso na palavra de ordem “Não ao Golpe. Fora Temer”.

Marcelo Barbosa é advogado, doutor em Literatura Comparada pela UERJ e diretor-coordenador do Instituto Casa Grande e autor, entre outros, de A Nação se concebe por ciência e arte – três momentos do ensaio de interpretação do Brasil no século XIX